Os quadros falam sem dizer. Falam dentro de nós, gritam, choram, fazem nos ouvir vozes que muitas vezes não queremos escutar. Mas em si, são emoldurados pelo silêncio inerente aos objetos, às pinturas. Um quadro não fala. Mas se fizermos uma ligação das vozes presentes nos quadros mudos, que nós ouvimos cada vez que apreciamos um obra de arte de significativo porte, e as molduras que cercam a tela, poderíamos dizer que são elas, as barras, as selas, as contendoras das vozes dessas inúmeras pinturas que imploram para dizer o que já está sendo dito. As molduras do silêncio. A prisão em torno dos homens, que vivem numa cela invisível, e não falam, não cantam, não sorriem. Talvez se removêssemos as grades que nos cercam, ou as molduras das pinturas, o silêncio seria quebrado e nossos gritos seriam mais do que uma breve, passageira, e interior inaudível loucura silenciosa. Assim, resolvi remover as molduras do silêncios dos tantos quadros que contam a nossa história, e deixar eles falarem através de um interlocutor, que como qualquer outro, poderia escutar, outros silêncios, outras vozes, outras alegrias, outras dores.

domingo, 7 de junho de 2015

EX FINGE

Fiel de ti e de ti somente, nunca escaparás de ti mesmo, de ti o único perseguidor,
Criador único do teu destino, pedra sobre pedra, fugindo de ti mesmo
É justamente quando te encontrarás, perdido, no meio do caminho, sobre olhos sem Predileção, ou julgamento, as pedras e os espinhos de teu ser sempre
Em moldável formação, argila dos meus pensamentos, quando pensei
Por um instante de abandono, desterrar-te de meus sonhos, e deixar-te
Nas movediças areias de um deserto exílio, em serena ilha amarelada pelas  pinceladas de Gauguin, um revoltoso oceânico temporal
Da abrandada praia me arrancou, e de volta para o tempestuoso visceral ondulante bascular oceano o  eterno pugilista incansável Destino me atirou, força esta indomável, quando sempre me coloca de volta na trilha de mim mesmo!
Ao som das trovoadas inflamantes, tronando os tijolos dos muros rompidos dizimados, os filhos frutos de um passado assombrado, as cracas que grudam no casco dos barcos, nas quilhas  e no cascado, e destoam de mira certa, soando como ruídos na melodia de Zéfiro invencível de um velejar certo e constante, as flechas inabaláveis dos arcos inquebrantáveis e inoperantes pelas mãos dos ardilosos embusteiros, os flechados pretendentes dentro e fora de nós, inúmeros farsantes, os pretendentes à ocupação de nós mesmos e da nossa fiel amante, quando assim não  encordoaram  o arco e a vela que nos pertence, a chama que somente nós atiramos ao sol, e numa reta, no meio do olho do astro atinge, e a duvidosa dúbia fala da quimera cinge,  bifurcando a língua ofidiosa da serpentária venenosa Esfinge, desmanchando sua pomposa impostação vocal, triturando sua entonação, sua armada postura, sua mítica  figura, sua falsa representação, respondendo as suas perguntas, seus incansáveis testes e armadilhas mil com um simples olhar e com um simples sim:

Sim, eu sou o Homem.

Para a vida e para mim, entorno do futuro no presente que me importa, para além de um passado inexistente, reluzo o fluxo dourado dos amores dos tempos vividos e viventes, dos seres amados no presente, nos tijolos que plantamos a cada segundo, com cada olhar benevolente, aquilo que não se desfaz, aquilo que não some mais, o que não tem fim, as sementes que regamos e o que plantamos na alma do nosso jardim, e na Terra do meu peito jaz. Sim, eu te atravesso, eu te decifro, eu te devoro até o último instante de tudo que sobrar te ti em mim.


FC




                                 OEDIPE ET LE SPHINX

                                       Gustave Moreau


Um comentário:

  1. Maiscuma sacada , super criativa, que brinca com o nosso livre arbítrio, ,o queremos parecer, para nós e para os outros, o quanto de venenos que digerimos e outro tanto que aspergimos...um pouco do desamor que constantemente nos tenta...👏🏼👏🏼👏🏼🙅🏼🙅🏼🙅🏼❤️😘

    ResponderExcluir