Os quadros falam sem dizer. Falam dentro de nós, gritam, choram, fazem nos ouvir vozes que muitas vezes não queremos escutar. Mas em si, são emoldurados pelo silêncio inerente aos objetos, às pinturas. Um quadro não fala. Mas se fizermos uma ligação das vozes presentes nos quadros mudos, que nós ouvimos cada vez que apreciamos um obra de arte de significativo porte, e as molduras que cercam a tela, poderíamos dizer que são elas, as barras, as selas, as contendoras das vozes dessas inúmeras pinturas que imploram para dizer o que já está sendo dito. As molduras do silêncio. A prisão em torno dos homens, que vivem numa cela invisível, e não falam, não cantam, não sorriem. Talvez se removêssemos as grades que nos cercam, ou as molduras das pinturas, o silêncio seria quebrado e nossos gritos seriam mais do que uma breve, passageira, e interior inaudível loucura silenciosa. Assim, resolvi remover as molduras do silêncios dos tantos quadros que contam a nossa história, e deixar eles falarem através de um interlocutor, que como qualquer outro, poderia escutar, outros silêncios, outras vozes, outras alegrias, outras dores.

sexta-feira, 5 de junho de 2015

BODAS DE SANGUE

Eu sou o silêncio e a obstinação,
No teu encalço bendito seja o meu sacrilégio, o meu querer te entender mais do que a mim mesmo, mais do que a busca incessante pela resposta que cala a palavra... o som do mistério,
Eu estou em ti agora,  como tu sempre estiveste em mim ao longo de toda nossa existência... a todo instante tua chama sempre devorando a vida em meus pensamentos... alimentando todo e qualquer mundo capaz de ser pensado.... o que existe por de trás do céu, quando arranco esse azul dos teus olhos? O que existe por de trás do véu que cobre tuas mentiras?....

Esse foi o teu maior erro, mentir de olhos abertos,  quando ainda era dia,  e todos enxergavam o que desenhavam as mãos do arquiteto...
Eu falava sem palavras sempre aquilo que querias ouvir... sem querer, pois com a antecedência dos marotos, lias o meu corpo ao silêncio do pensar e dobravas a esquina já com caminho de volta nos lábios.... trazias sempre as desculpas com finais perfeitos, os indícios sem desilusões, as pistas estéreis, as doces expressões angelicais.... ai, como poderia esquecer, todas elas nos irretocáveis quadros da face, como virgens madonas de Rafaéis espalhadas pelo suntuoso quintal de um museu de encontros diários, um jardim de pássaros e flores ornamentais...
Para onde os homens se levam quando brincam de serem irmãos?

O que existe no silêncio quando quebro o som da palavra com a minha respiração muda, indignada, desconcertante.... ?
Oca palavra sem sentimento, ingrata sílaba fora do tempo que germina vaidade e escuridão, o que seria do homem imperfeito sem a telha da casa que lhe deu o chão?
Como pisar sem teto, como voar sem uma asa?
Como ser Deus no espaço de tempo onde bailarino sem pernas dança sem vento quando lamenta somente a dor daquilo que um dia lhe fez sonhar, e não as pernas que perdeu para os cobradores do Destino ?
Como ser alma sem calor?
Como ser braço sem vontade?
Como ser homem sem amor?
Como ser irmão sem amizade?

O que existe quando não me suportas olhar por mais de alguns instantes... Por que desvias o olhar? O que lhe faz não suportares meus olhos nos teus? O que lhe faz não me veres? Não me enxergares? Não enxergares o que existe dentro de mim?
O belo Abel no infinito amor de Caim...
O triste começo do que foi, e o começo inevitável do fim
O que não nos torna humanos? O que não nos torna humanos nunca mais? Os homens na casa, e os lobos no jardim. Para além dos pequenos pedaços de carnes que nos cercam, dos pequenos metais, o que nos torna tão pequenos, tao abjetos, tão animais?

Para além dos quartos que separam as paredes que separam os homens, o que existe de verdade no mundo além de carne e tijolos? Além das vontades pessoais e dos amores impessoais, o que existe mais? O que existe além dessa vaidade ilimitada que confunde a razão, o que existe além do homem e do coração?  Além das entranhas de concreto no silêncio do quarto.. além de nós dois e dessa dupla sinceridade infantil, o que mais existe de verdade no mundo?
O silêncio e a abstração
Sou o vazio e o abraço
O carisma e a saudades
Sou o espaço da contração entre um sorriso e o esquecimento
Morremos para não nos sentirmos só
Não nascemos para morrermos na solidão...
Vivemos uma fatalidade
De Esperança e Amor
Que venham aqueles que ainda esperam
Que o mundo seja como ele ainda é nos nossos sonhos
E nos dias que já existem entre...e dentro de nós
Que caiam os
Brutos
E que fiquem os
Irmãos

FC



                                      "CAIM E ABEL"

                                            Tiziano

Um comentário:

  1. Enimático e emocionante!lindo do começo ao fim, uma nódoa dos pecados e maus pensamentos e até dos desejos escusos que rondam nossas mentes.Paradoxalmente, "o infinito amor" a esperança , e que final lindo!!!👏🏼👏🏼👏🏼🔝🔝🔝😘😘😘

    ResponderExcluir