Os quadros falam sem dizer. Falam dentro de nós, gritam, choram, fazem nos ouvir vozes que muitas vezes não queremos escutar. Mas em si, são emoldurados pelo silêncio inerente aos objetos, às pinturas. Um quadro não fala. Mas se fizermos uma ligação das vozes presentes nos quadros mudos, que nós ouvimos cada vez que apreciamos um obra de arte de significativo porte, e as molduras que cercam a tela, poderíamos dizer que são elas, as barras, as selas, as contendoras das vozes dessas inúmeras pinturas que imploram para dizer o que já está sendo dito. As molduras do silêncio. A prisão em torno dos homens, que vivem numa cela invisível, e não falam, não cantam, não sorriem. Talvez se removêssemos as grades que nos cercam, ou as molduras das pinturas, o silêncio seria quebrado e nossos gritos seriam mais do que uma breve, passageira, e interior inaudível loucura silenciosa. Assim, resolvi remover as molduras do silêncios dos tantos quadros que contam a nossa história, e deixar eles falarem através de um interlocutor, que como qualquer outro, poderia escutar, outros silêncios, outras vozes, outras alegrias, outras dores.

sábado, 13 de junho de 2015

CASTA DIVA



                      " O SALÃO DA RUE MOULIN"
                           Henri de Toulouse-Lautrec





CASTA DIVA 


As meias calças do fim do mundo, os quartos escuros e vermelhos
Meias calças e meias putas,
Nos quartos dos homens das moças virgens,
E dos meninos putos cujos reflexos se comiam dentro dos espelhos
Se comiam aos pedaços, por inteiro
Cada músculo
Cada carne gesticulava uma vontade impessoal
Cada membro interferia no conjunto como se fosse um particular
Movimento de um falacioso imodesto aglomerado de relaxáveis tensões inflexíveis


Eram todos eles virgens e ordinários, todas elas meninas com rosto de
Princesas, as pérolas negras do fundo do mar.., onde afundavam-se
Os transatlânticos, as transas dos transoceânicos, os transcendentais
Transexos dos animais, dos necrófilos, dos pedófilos, dos zoofilicos, dos anamórficos, dos anões, dos transmissíveis venenos escorrendo pelas paredes vivas
os transversos e os transexuais... os tântricos transpostos e os transcursais completando  
a infinidade da cena
Das bizarras barbaridades sexuais

o tipo de lugar para se tornamos um pouco mais indecentes, para podermos pertencer um pouco mais a esse mundo.... exatamente! o nobre sentimento da indecência coletiva, éramos perdoados e ali diluíamos nossas culpas junto ao todo universal, éramos crucificados sendo indivíduos livres liberados de uma suposta inexistente cruz... estávamos vivos, pulsantes, carnais e mais sexuais do que  um carnaval de Veneza sem máscaras, onde toda cidade andava nua...mais canibalescos do que todas as orgias de Paris aglomeradas num único porão... as nossa mentes em flutuação, germinando o próximo lugar, o próximo encontro, e a próxima dose de diluição...a santa moralidade da moderna beatificação ... carnal! 

Ali era o tempo onde recebíamos a hóstia e a comunhão! Sagrada libação do culto dos nossos dias! Libiamo...

O cenário pós apocalíptico quântico de um semântico tântrico aquântico atlântico
Derramar de mares e jorrares de meninos salivantes, de estátuas vivas
Ejaculantes....

Os gritos presos nas paredes,
Lustres balançando com o frenesi dos corpos uivantes
Os uivos e as correntes
As mãos da escuridão apalpando os meus quadris
Os teus lábios febris
No veludo vivo santificado das divisórias das baias
Coveiros e carniceiros
Bruxas pirofágicas
Incontáveis homens na fila do banheiro
Os homens  incendiários do couro e festim
Do vinil e do chicote
Das latas de lixo e do serrote
Ser humano mascote
Do pior que sempre encontrou para si
Apenas para ter uma sensação de não vazio
Presa na coleira
Prostitutos da alma que não tem preço
Onde encontramos um bordel de tamanha desumanidade?
Realmente
Hoje eles se espalharam por todos os lugares

Vendo meu corpo com apreço
Mas minha alma continua com endereço

E aquele que meu corpo comprou por algumas horas,
O que de si tinha vendido para o Cafetão dos Espíritos Santos?
Meu pai eterno
Vender o que não tem preço
O que não tem retorno?
Há algo de errado nisso
Os prostitutos da alma, de sofisticados endereços, que pagam as putas tristes
que vendem o seu corpo, mas pagam a conta da luz...
Nisso vejo distorções!
Trevas e cargos de grandes fundos,
Internacionais e monetárias instituições
Os altos cargos dos prostitutos financeiros
Pagam as nossas putas meninas
E fazem um tráfico de almas
Instituindo a máfia do próprio enterro
Os cargos de coveiros que passam uma vida sentados em cima de um banco
Os coveiros banqueiros
que não tem alma 
que não tem cargos
que não tem nada
no final
pra barganhar
para não se atirarem de uma cobertura de luxo
do topo do último andar
venderam suas asas
para o demonio
e há muito 
desaprenderam a leve e inocente
capacidade de voar
inerente àquela menina triste
que por uma nota de 100 libras
ou uma uma grama de heroína
fica de quatro uma noite inteira, 
sem calcinha, 
em cima da mesa
deixando todos aqueles monstros
de Alzheimer tremerem e babarem
suas gotas semeadoras de 
tristezas...e lágrimas de perversão
as putas mortas em cima da mesa
presas incendiárias na pirofagia
das cobras víboras do colchão




A meia noite no escuro do salão, nada mais do que gritos
Almas socorrendo um lamento de perversão
Solidão jamais
Eram quentes e vulcânicas explosões
Das precoces ejaculações humanas
Eram atemporais e fugazes
Eram as fugas e as pazes
De ser um enorme e profano puro prazer
Absoluto incontestável
Ser
Escorrendo pela pele
Transpirando
Pelo grito
Do suor
Latejante e visceral
Os meninos e as meninas
Os homens e as mulheres
Os humanos em geral
Se arrastando no gozo de pertencerem a mesma espécie
Se lambuzando na mesma cor
E no escuro se misturavam
Sem distinção
Se transformavam numa só carne
De mesmo pulso
E gestação,
Um só útero
Penetrado
Por uma fálica
União

O gozo
Interminável gozo
Poético da carne eterna
E profana
De uma momentânea ejaculação
O tanto que se ama
Para se gozar no fim
O tanto que se coloca
Para segurar o máximo das peles
E dos prazeres soltos como um vendaval
Temporal dentro de mim
Todos iluminados pela escuridão
Ali eram iguais
Da mesmas cor do pecado
Sem nenhum preconceito
Sem nenhuma distinção 
uma voz de esperança
e um grito de perdão



 Assim voam os anjos até o final
Atravessando os muros do jardim
Assim estavam as sorridentes putas profanadas, de pele amarelada, esperando o próximo cliente
Com suas meias calças esticadas, rasgadas, soletradas pela indistinta falta
De opção, de serem tudo aquilo que são, e até poderem disso tirarem algum
Proveito
As putas e os putos
Imperfeitos
Sem defeitos
Humana imperfeição
Quando somos todos clientes do vício da carne
Eterna
Quando te quero nas memórias do amanhã,
Sem pensar, sem engano, sem acabar
Gozando sempre
Pelas janelas
E pelo quintal
Te quero feliz
Sempre assim
Completamente: Nu

Mesmo quando for embora
E nesses teus olhos de bordel
Botares um ponto final
Meu puto carniceiro
Meu menino celestial


FC 

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