Os quadros falam sem dizer. Falam dentro de nós, gritam, choram, fazem nos ouvir vozes que muitas vezes não queremos escutar. Mas em si, são emoldurados pelo silêncio inerente aos objetos, às pinturas. Um quadro não fala. Mas se fizermos uma ligação das vozes presentes nos quadros mudos, que nós ouvimos cada vez que apreciamos um obra de arte de significativo porte, e as molduras que cercam a tela, poderíamos dizer que são elas, as barras, as selas, as contendoras das vozes dessas inúmeras pinturas que imploram para dizer o que já está sendo dito. As molduras do silêncio. A prisão em torno dos homens, que vivem numa cela invisível, e não falam, não cantam, não sorriem. Talvez se removêssemos as grades que nos cercam, ou as molduras das pinturas, o silêncio seria quebrado e nossos gritos seriam mais do que uma breve, passageira, e interior inaudível loucura silenciosa. Assim, resolvi remover as molduras do silêncios dos tantos quadros que contam a nossa história, e deixar eles falarem através de um interlocutor, que como qualquer outro, poderia escutar, outros silêncios, outras vozes, outras alegrias, outras dores.

quinta-feira, 11 de junho de 2015

NATUREZA HUMANA



                              "O NASCIMENTO DE VÊNUS"
                                        Sandro Botticelli






NATUREZA HUMANA


assim tão clássica, vossa Alteza,
como devo lhe chamar?
quando atirado aos teus pés me coloco subordinado
totalmente atravessado
desconcertado
destituído de todas as minhas certezas
somente por um instante de teu olhar ter em mim mesmo capturado
aquilo que sei ver
e distinguir, aquilo que sei identificar
o que não posso enganar, e distorcer
aquilo que sei ser
tão certo como vejo
o mundo ao meu redor
empurro para o meu subconsciente
o claro e manifesto desejo
de existir e não resistir
a querer somente
por um instante apenas
poder te possuir
total e completamente
minha Alteza
os teus traços dentro de mim
chama que todos chamam Beleza
a tal insustentável
incomparável
leveza
absoluta
que queremos todos ter
podes ser uma  completa perdição,
pois não escolhes para quem se doa,
na espuma do nascer
e somente possuir-te é o suficiente para ser detestado
palavra sequer precisa
mudo e calado
num mundo onde a morte da Beleza há muito já foi decretada
o seu obituário
em corredores de incertezas e submundos
onde os carrascos retalhados
dominam as estradas de asfalto e fé
seu dom é uma virtude perigosa
pois nessa Terra de vilezas
caçados são os olhos da Beleza
como esmeraldas e rubis
vendem seu sursis os caçadores de recompensas
virginal incólume pureza

amantes dos diamantes
ou
diamante nos dedos dos amantes?

sua integridade é posta em cheque
por jogadores que escondem as cartas sobre a mesa
vossa Alteza,
por que és tão rara, e tão dúbia?
abalando humanas fortalezas
testando retidões ao cume de sua nobreza
confirmando-se a firmeza das cordilheiras humanas inabaláveis
o caráter e a honra
quando ultrapassados por ti
a firmeza de resistir-te
com divina delicadeza
pois para mim, vossa Alteza,
 não caberia nada
absolutamente nada
 num mundo
onde ausente estivessem os teus traços
um mundo de tristezas
pois morto seria um mundo sem Beleza




"é como voar sem saber
é como ser sem precisar
é como olhar além de ver
é como chorar e se inundar
é como rir e não parar
é como ter e sempre dar
é como um céu a mergulhar
dentro dos olhos de alguém
é como uma cor nascendo sempre
em algum alvorecer
é como uma luz que nunca apaga
é como um sonho infinito
é como uma felicidade silenciosa
é como estar ao teu lado por apenas alguns instantes
e dividir as cores do mundo
com o teu jeito explícito de ser
é como ser surdo contigo e o canto dos pássaros
escutar
é como ser um oceano
e em si mesmo mergulhar
é como ser uma flor
e não morrer nunca mais
é ter o doce dos teus olhos
e o perfume dos anjos
as asas dos deuses imortais
é navegar sem voltar jamais
é nascer no horizonte das manhãs
é se pôr nos horizontes das tarde sem finais
é não perder um instante sequer dessa vida inteira
é estar de mãos dadas com algum milagre sem saber
é se desapegar de tudo que passa
e amar tudo que vem
e se doar a quem se ama
e dividir o pouco que se tem
e fazer de uma tristeza
as ruínas coloridas da vida
e de uma doença uma escada
de uma morte um adeus
de um espelho um tempo para pensar
em o que fazer em seguida
e sorrir lembrado o que já se fez
com calma, com tempo, com alegria
é de um jardim ser o florescer
é tudo isso e um pouco mais
se sendo sem saber
é quando se sorri
mesmo no escuro
quando todos dormem no mundo
é quando não se desiste,
mesmo quando tudo na vida insiste
da magia de viver
e lutar para ser algo melhor e maior dentro de si mesmo
é viver sem morrer um pouco por dia
é dormir e sonhar quando se fecha os olhos
e poder dizer
sim, hoje o dia existiu belo dentro de mim,
é estar aqui e poder sempre aprender
e sempre, sempre
poder dizer
OBRIGADO"





FC 

Um comentário:

  1. Lindo ,que delicia acordar com esse poema,da fugaz beleza da juventude à eterna beleza que devemos cultivar : "...olhar alem de ver". A beleza de entender que quanto mais sabemos, mais nos conscientizamos da nossa ignorância e do nosso minúsculo tamanho perante a natureza....a beleza é a nossa luta pela vida,o amor....👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻🔝🔝🔝❤️🙅🏻😘

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